Monday, September 24

As Palavras Interditas

Os navios existem e existe o teu rosto
encostado ao rosto dos navios.
Sem nenhum destino flutuam nas cidades,
partem no vento, regressam nos rios.

Na areia branca, onde o tempo começa,
uma criança passa de costas para o mar.
Anoitece. Não há dúvida, anoitece.
É preciso partir, é preciso ficar.

Os hospitais cobrem-se de cinza.
Ondas de sombra quebram nas esquinas.
Amo-te... E entram pela janela as
primeiras luzes das colinas.

As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas minhas curvas claras.

Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
e estas mãos noturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.

E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.

Eugénio de Andrade

4 comments:

Anonymous said...

Do Eugénio? Ou as nossas?
Passei quase de corrida e verifico que este blogue cresceu - de muitas maneiras. Parabéns, R. Joanna :)
Um beijo

Anonymous said...

http://circopulga.blogspot.com/

Anonymous said...

decidi sair do armário... :D

R.Joanna said...

De Eugénio precisamente.
E as nossas, sempre, claro :)