Monday, June 15

Mal etiquetada (vilã)

As pessoas adoram labels, tabelas, gavetinhas. E têm ódios particulares - principalmente com aquilo que elas chamam as diferenças. Ser homossexual, até há pouco tempo, era ser diferente, por isso os homossexuais "irritavam", supostamente por uma série de razões, que na verdade se resumiam a uma verdade: eram diferentes. Hoje em dia esse lugar foi (por um lado felizmente) ocupado por outras questões menos importantes, como o "ser feminista". E "ser vegetariano". Ah, as dores que causam aquelas pessoas que dizem que são vegetarianas, a vontade de saltar da cadeira insultado para lhes esfregar o bife e a anemia na cara! A maior defesa destas pessoas é, portanto, fecharam-se nessa definição, reduzindo as suas ideias àquelas que a pessoa que as julga acha que têm. Se a pessoa que é vegetariana insistir muito em salvar o planeta e cuidar dos animalzinhos, enquanto ignora outras questões pertinentes, é deixada em paz, de uma forma ou outra. Se for coerente nesta sua atitude. Porém, ai daquele que não for coerente, que diga que é vegetariano mas que coma carne nalgum dia! Isso não pode ser, saltam os grandes inquisidores da coerência e dos valores, que até então gozavam com o protector das alfaces, e que agora o vêm chamar vira-casacas, traidor, desonesto. Dizer que se é vegetariano não é a pior forma de ser um pária social; a pior é dizer-se que se é vegetariano, ao mesmo tempo que se nega a gaveta, e se salta dessa prateleira para outra coisa. Porque as pessoas aceitam os bem-comportadinhos, mesmo diferentes, se estes se deixarem na sua gaveta. Agora saltar de gaveta em gaveta, ou pior!, ocupar o espaço de mais do que uma, isso é lesa-majestade, é fraude ao sistema tão funcional de preconceitos que construímos. 

Mas a verdade é que eu não pensava escrever sobre isto, quando vim para a página branca. Eu queria falar sobre a minha razão de ser uma vegetariana falhada, a vegetariana que come o prato proibido uma vez por mês mas continua a achar que tem o direito de, se a obrigarem a entrar numa gaveta formalmente, escolher a gaveta sem carne. Porque essas razões não têm nada que ver com as razões que muitas pessoas pensam com certeza que governam estas coisas, desde a saúde à mera preguiça ou vontade social de dobrar. Não, são bem mais profundas, e negativas: são o mal na sua essência. Comer carne é, para mim, uma prática do mal, uma missa negra maldita, com a cruz invertida. O pecado pessoal, íntimo, prazeroso de quem causa um ferimento e se sai bem com isso. Eu sou tão má como a pessoa do lado, mas tenho a minha maneira específica de ser má - tal como boa. Eu sou boa demais, vezes demais, para pessoas más de mais, que irremediavelmente se aproveitam para cumprir as suas próprias maldades e se limparem em mim. E eu sou boa, quero ser boa, mas não sou parva - como essas pessoas sempre pensam. Eu sei o que se está a passar, e ainda assim não mordo; porque não quero. Normalmente porque não quero identificação com essa origem de mal, porque não quero problemas de consciência, eu que os tenho mais fácil. Como diz o R., eu gosto de ser a pura, a que está moralmente acima. Essa é a minha forma de maldade, por isso cultivo-a, com requinte, regada com sangue inocente. Morderei - mas não naquela altura, não a pessoa que merecia, mas um frango no churrasco da esquina. 

6 comments:

Anonymous said...

Cara R. Joanna, o seu desconhecimento, ignorância e petulância face a tantas coisas básicas da vida chocam-me e indignam-me profundamente. Ainda que tenha hesitado, não pude deixar de me manifestar relativamente a este seu post.

“Hoje em dia esse lugar foi (por um lado felizmente) ocupado por outras questões menos importantes, como o "ser feminista".

Desde quando é que o feminismo é uma questão menos importante do que a homossexualidade? Estava a ser irónica, espero? Acha mesmo que já existe igualdade entre homens e mulheres?!

Desde quando é que o feminismo se tornou apenas recentemente motivo de hostilização? Aconselho-a a informar-se acerca da luta das mulheres nos últimos séculos.

Desde quando é que os homossexuais já são aceites pela sociedade? O que vivemos é a cultura das aparências. Finge-se que se aceita mas na verdade a maior parte das pessoas olha para eles com desprezo e/ou pena. É como alguém dizer que não é racista, porque é que havia de ser, “os pretos não têm culpa de ser pretos, coitadinhos”.

Em relação ao vegetarianismo, se a R. Joanna come animais uma vez por mês, não é vegetariana. É alguém que só come animais uma vez por mês. Os vegetarianos não comem animais, nunca, ponto final, porque a simples ideia de o fazerem, ainda que “apenas” de vez em quando, é simplesmente repulsiva e aberrante. Ter consciência plena do massacre animal e ser capaz de comer animais é repulsivo e aberrante. Ter consciência plena do massacre animal, mesmo assim ser capaz de comer animais “de vez em quando” e ainda por cima dizer-se vegetariano, não tem nome, sequer. É pior, muito pior, do que fazer aquilo que 99,9% das pessoas fazem, que é ser feliz na ignorância, querendo acreditar que um bife e uma vaca não estão de forma alguma relacionados e que se não comêssemos carne o mundo colapsava com excesso de animaizinhos, ou que a criação massiva de animais é um mito urbano inventado por ambientalistas radicais que não têm questões reais com as quais se preocupar. Ou, ainda, que os peixes, os crustáceos e os moluscos não são animais.

Parece-me, portanto, que quem se preocupa com os rótulos é a R. Joanna. Se não é vegetariana porque é que se quer rotular como tal? É normal que as pessoas se irritem com essa incoerência. Quer passar por alguém mais ético que os outros e afinal de contas é a menos ética de todos.

Há que ter em conta, ainda, que hoje em dia, para muitos, ser vegetariano é apenas uma questão de moda. É muito “cool” não comer animais e pedir um hambúrguer vegetariano quando se vai ao McDonalds com os amigos, porque dá um “style” brutal, mesmo a condizer com o verniz carmim, a pulseirinha de cabedal e o perfume da Tommy. É muito “cool” defender os animaizinhos e até fazer parte da UZ, ter uma dieta “saudável” e proclamar-se aos sete ventos que não se contribui para a morte de nenhum ser animal e depois sucumbir-se ao bifinho ou ao peixinho “de vez em quando” com uma risadinha tímida porque “a vontade era muita”, argumentando que mesmo assim “somos melhores que os outros porque é só de vez em quando”. É como um assassino saber que é assassino e só matar uma vez por ano. Ou um pedófilo ter consciência que é pedófilo mas só sucumbir aos prazeres da carne uma vez por mês. Sem dúvida é muito mais aceitável. Sobretudo quando se tem a consciência exacta do que se está a fazer. Ah, foi só um deslize, afinal de contas, quem é que não peca?

Anonymous said...

Para terminar, e porque já me alonguei demasiado, deixe-me dizer-lhe que é extremamente infeliz essa sua consideração final. Valia mais que tivesse, de facto, a coragem de “morder” humanos.

Coma o seu animal quando bem entender e pronto. A sua dieta não diz respeito a ninguém, afinal de contas. Admira-me que, sabendo tudo o que sabe, consiga comer animais sem vomitar, mas o importante é que a sua ética e a sua consciência andem de mãos dadas e em harmonia.

Se não temos aquilo que queremos, porque falhámos, ao menos temos algo “parecido” e passamos a vida a lamentar-nos por isso, porém como se não lamentássemos, e com ares de arrogância. Podia ser uma boa definição de “pseudo”, certo? E viva a autocomiseração mascarada de rebeldia.

R.Joanna said...

Ahahah obrigada pelo comentário, parece que fez de propósito para ser exactamente aquelas pessoas em que eu estava a pensar enquanto escrevia, aquelas que adoram julgar os outros sobre os quais não sabem a mais pequena coisa, ofendidos por eles não estarem na caixinha ou falaram na existência desta. A verdade é que ser minimamente inteligente é perceber que eu não tenho um blog de opinião, que não escrevo para ser clara para ninguém, e portanto sobra pouco (se é que já não sabe isto) - depois de ler este meu texto a verdade é que não faz a mais pequena ideia sobre o que é que eu acho sobre feminismo, sobre racismo, sobre homossexualidade (e já lhe passou pela cabeça que eu possa, por ex., ser de facto africana e homossexual? Claro que não, porque isso abalaria a convicção de que eu pretendo insultar alguém, e que quem insulta não é, e nós não queremos esses dogmas abalados). Adorei particularmente o vegetarianismo-moda, ah, esse cliché tantas vezes repetido, e a crítica do sucumbir à vontade e ainda assim ser moralmente superior. Essas são realmente as ideias energúmenas que eu de vez em quando ouço e a que me referia, que bela caricatura. E a ideia que transparece no seu comentário de que eu escrevo para me sentir menos mal com alguma coisa, para expiar um pecado... Caríssimo, a minha maldade é isso mesmo, assunto meu, e eu não sou católica, por isso não acredito que irei para o inferno, muito menos por me dizer vegetariana ou por comer carne, e os dois juntos (cruzes credo!).

"A sua dieta não diz respeito a ninguém, afinal de contas. Admira-me que, sabendo tudo o que sabe, consiga comer animais sem vomitar, mas o importante é que a sua ética e a sua consciência andem de mãos dadas e em harmonia."

Ahahaha a minha dieta pelo vistos diz-lhe respeito a si, que se dá ao trabalho de a comentar com tanto afinco. Eu pensaria que era uma piada, se não se tivesse dado ao trabalho de escrever tanto, e tanta parvoíce e contradição. E se ficar a pensar "se é para si então porque é que escreve num blog" relembro-lhe mais uma vez aquele que devia ser o seu mantra daqui para a frente: eu só sei que nada sei, que as razões dos outros são deles mesmos e que eu não as conseguirei apreender a partir da minha pequenez mesquinha.

Finalmente, parabéns pela enorme coragem de defender as suas opiniões com tanto afinco do alto do seu anonimato :)

(se bem que eu adorava mesmo era que fosse uma das pessoas que eu conheço e que sabem que eu tenho este espaço pessoal e se identificasse, para eu não ficar a achar que tenho mesmo razão quando acho que a maioria das pessoas está a precisar de umas palmadas de bom senso).

Anonymous said...

Cara R. Joanna, gostei particularmente da forma automática como assumiu que eu sou um homem. Serei um homem? Para si serei género neutro. Gostei também dos seus "hahaha" quando não tinha argumentos. Aliás, não deu resposta a uma única das minhas questões, apenas se limitou a ser defensiva e agressiva. Na verdade, também não pretendia que desse respostas, só queria passar o meu ponto de vista, e, relendo o que escrevi, acho que o fiz bastante bem. Se considerar pertinente diga-me onde estão as "parvoíces e contradições", eu valorizo sempre uma crítica desde que seja bem estruturada e construtiva.
A propósito, eu sou vegetariano/a (género neutro) portanto não creio que me enquadre no grupo de pessoas de quem está a falar, ou seja, os "não-vegetarianos". Quanto ao anonimato, qual é o problema? A R. Joanna não me conhece, de qualquer modo, tanto faz se me chamo António ou Daniela. Quanto ao facto de a sua dieta me dizer respeito ou não, bem, a R. Joanna tem um blog público, logo, creio que partiu de si o facto de nos dizer respeito a todos.
E, sim, comento com afinco, não só o texto da R. Joanna (não se sinta assim tão especial) como todas as teorias do género desta com as quais me deparo. E, digo-lhe, sinceramente, nos últimos anos, desde que sou vegetariano/a, irritam-me mais os pseudo-vegetarianos do que aqueles que comem carne com orgulho e ignorância. Na ignorância, ao menos, há sempre uma esperança. Não condeno, à partida, quem não possui o conhecimento das coisas. Agora, quem o tem, e decide, neste caso concreto, chacinar animais, é deplorável.
Quanto ao "vegetarianismo-moda", é um facto, infelizmente, não
fui que inventei o cliché que a R. Joanna tão bem denominou.
Ah, e todos nós "expiamos pecados", sendo católicos ou não (eu, por acaso, sou ateu/eia). Creio que uma das definições de "pecado" é "falhar o alvo". Não falhamos todos, tantos alvos, ao longo da vida? A religião é apenas uma metáfora. O sentimento de culpa só o abraçamos se quisermos. Mas quando se tem uma consciência aguda das coisas que nos rodeiam é difícil não nos sentirmos pelo menos um pouco culpados de alguma dessas coisas - chama-se responsabilidade e é uma das consequências da inteligência.
E, entenda, a questão que me levou a comentar o seu post não foi o facto de a R. Joanna comer carne, a minha "militância ideológica" não vai a esse ponto. A questão que me levou a despender tempo com o seu texto foi precisamente o facto de a R. Joanna comer carne sabendo o que isso implica e dizer-se vegetariana. E, claro, o acaso de o Google me ter trazido ao seu blog.

R.Joanna said...

Sabe tão bem como eu que o anonimato é a forma escolhida por aqueles que querem ofender desde que existe essa possibilidade na internet. E não interessa se não me conhece, porque é uma forma de respeito. Se não se dá a esse respeito, então eu vou tratá-lo no masculino, que é a forma neutra actualmente existente no Português - e não são precisos poderes de dedução fantásticos para ler os seus comentários anteriores e perceber que se deve tratar de uma senhora (nunca conheci um homem que se ofendesse com qualquer referência ao feminismo que não fosse um louvor) e vegetariana (também nunca conheci um não vegetariano que dissesse "Os vegetarianos não comem animais, nunca, ponto final, porque a simples ideia de o fazerem, ainda que “apenas” de vez em quando, é simplesmente repulsiva e aberrante", e já agora, parabéns por ser o arauto da verdade e das razões dos milhões de vegetarianos que andam por aí). Aqui vai o masculino neutro então - oh, mais um motivo para eu ser excomungada, mais uma falha de alvo, como é que me atrevo a não usar a @ para não produzir uma comunicação sexista?! Parece que eu não tenho mesmo salvação.

"A questão que me levou a despender tempo com o seu texto foi precisamente o facto de a R. Joanna comer carne sabendo o que isso implica e dizer-se vegetariana." Ah, isto é militância ideológica, sim, porque se eu quiser dizer que sou um alien com pintinhas amarelas é comigo, não tem que me vir corrigir para bem da humanidade. Veio a um blog claramente pessoal, que se expressa sobre opiniões pessoais, colocar a sua opinião pessoal sobre o que eu devo ou não chamar-me. Se isto não é falsa moralidade militante, então não sei o que seja.

Quanto aos risos, finalmente, não eram falta de argumentos, eram risos mesmo, porque os seus comentários fizeram-me rir. A situação de eu escrever um texto pessoal sobre muito mais e muito menos do que vegetarianismo e outras militâncias e saltar-me o cliché vivo e indignado desse mesmo texto foi demasiado engraçada, principalmente porque eu até pensei que estava a exagerar, mas afinal não estava. Se eu quisesse argumentar consigo sobre o Bem e o Mal até ao infinito acredite, eu dava-me a esse trabalho, gosto de debates, gosto de ouvir opiniões. Mas a sua publicação foi claramente um despropósito num texto alheio que não contém opiniões claras sobre coisa nenhuma, nem pede debate. E por isso, se me permite, se tanto o indigna que eu me expresse livre e poeticamente sobre a minha vida no espaço onde eu bem entender, leve a sua indignação para outro lado, que ninguém o obriga a ter de aturar as reflexões dos outros sobre a vida e, felizmente, ainda estamos numa democracia, ainda que esta esteja cada vez mais pejada de pessoas que acham que defender um valor pode ser feito até através do insulto e da ingerência pessoal.

Não se iluda: também não é uma pessoa melhor porque é um vegetariano "puro", nem porque se indigna em comentários de 20 linhas com quem não é e está a faltar às suas responsabilidades.

Este blog é público por razões que são comigo, mas estas não se relacionam com debates ideológicos sobre textos meus que são metáforas de desabafo. Para uma boa discussão ideológica vou ao facebook ou a tantos outros lugares maravilhosos que existem para isso hoje em dia. Por isso passe bem, não direi que foi um prazer porque é mentira, mas faça o favor de levar a sua enorme moralidade para outro blog mais avesso a essas coisas, porque eu não lhe responderei mais.

Anonymous said...

Cara R. Joanna, parabéns! Sabe contar até 20! Pena que não esteja aí consigo para lhe poder oferecer o merecido reforço positivo pela sua proeza! (:

Duvido muito tê-la feito rir com os meus comentários! No entanto acredito que fique bem dizer isso, pois passa uma falsa ideia de desprezo e superioridade. Aliás, pela forma como estrebuchou desesperadamente perante os meus comentários, eu diria mesmo que a R. Joanna sabe que eu tenho razão!

Eu não sou moralista, simplesmente tenho convicções e tento ser coerente com os meus princípios. Acredite que dá trabalho, por isso mesmo é que é tão raro nos dias de hoje. Geralmente, chamar-se moralista a quem tem princípios costuma ser o "grande argumento" daqueles que não têm princípios de todo. Eu não considero ser melhor que ninguém, o meu objectivo é simplesmente ser o melhor de mim mesmo/a, para mim mesmo/a.
Eu não disse que não fazia militância ideológica, disse que a minha militância ideológica não ia ao ponto de ser ofensiva com as pessoas que comem carne. No entanto, volto a repetir, que não tenho a menor paciência para quem come animais e diz que é vegetariano. Por isso mesmo aconselho-a vivamente a informar-se melhor acerca daquilo que é realmente o vegetarianismo antes de erguer bandeiras a favor de um conceito que desconhece. Já agora podia aproveitar o embalo e ler também umas coisinhas sobre feminismo!
E vou terminar por aqui, não se preocupe, pois não me dá nenhum prazer ou estímulo falar com pessoas com ideias tão pequeninas e bacocas. Além disso, metade do que a R. Joanna disse nem sequer fez o menor sentido, nem merece ser comentado, pois exprime apenas cegueira e brutidade intelectual.
Gostaria apenas de acrescentar que o seu "blog claramente pessoal" é público e tem um espaço para comentários públicos, portanto é um direito de quem por cá passa dizer o que lhe apetecer e exprimir livremente as suas opiniões, sejam elas de agrado ou de indignação.